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Sound Bytes e Emoções

António Braga: uma escolha amarrada ao passado

Sound Bytes e Emoções

Ideias

2024-05-24 às 06h00

Margarida Proença Margarida Proença

Há uns anos, largos, numa conferência ouvi um professor de economia, figura reputada e muito considerada, afirmar-se como “desapontado com a teoria económica standard”. Na altura, tal afirmação surpreendeu-me e chocou-me verdadeiramente, mas hoje compreendo-o cada vez mais.
As teorias do processo político baseiam-se em hipóteses sobre o comportamento dos atores da política; os economistas assumem que estes se comportam de forma racional, maximizando a sua utilidade marginal. Digamos que se acredita que cada indivíduo conduza, de certa forma, uma análise custo-benefício por forma a determinar qual é a sua melhor opção, procurando maximizando as suas vantagens pessoais dadas as suas preferências individuais. Daqui foi-se extraindo a ideia que os eleitores respondem tanto mais positivamente quanto melhor for o ambiente macroeconómico.

Em Portugal, nos últimos anos, foi-se instalando cada vez mais a ideia que o país estava a ser ultrapassado pelos países do Centro e Leste Europeu, e por isso empobrecendo. Num artigo recentemente publicado na revista Visão, da autoria de Manuel Caldeira Cabral, mostra-se, contudo, que o país convergiu com os países mais ricos do mundo em termos de PIB per capita.
Entre 2015 e 2023, não só Portugal não foi, de facto, ultrapassado por nenhum país de Leste, como convergiu com todas as economias da U.E.-15, com a exceção da Irlanda. Portugal aproximou-se da Alemanha, Espanha, França e mesmo dos EUA e do Japão, e a um ritmo mais rápido nos últimos 8 anos que na década e meia após a adesão.

A análise e a abordagem do Professor Caldeira Cabral são muito interessantes e antagónicas da retórica que se foi instalando nos media e no debate político. Esta evolução positiva deveu-se em grande medida ao cuidado com a redução no endividamento externo, mas também à evolução no mercado de trabalho nomeadamente no que diz respeito à imigração, a par do turismo e do apoio à internacionalização e à inovação.
É certo que o Covid e depois a guerra na Ucrânia, no contexto de uma enorme instabilidade global, a inflação e o aumento das taxas de juro, as pressões em mercados como o da habitação, e as ondas de choque ainda sentidas da presença da troika, se conjugaram para leituras diversas.

Voltando ainda às teorias explicativas do processo político, outros autores que não economistas têm sublinhado o papel das emoções. Os indivíduos, adiantam, identificam-se com grupos que se aproximam da sua identidade social e das suas relações inter-grupo. Esta identificação social tem aspetos cognitivos, mas também afetivos, e isto funciona quer seja um clube de futebol, um grupo profissional, uma região ou um partido político, entre outros. E ao sentimento de pertença, à emoção do comportamento inter grupo, corresponde também um sentimento de distinção dos outros. E cada grupo privilegia os seus próprios objetivos.
A abordagem política do governo atual responde às emoções por forma a controlar o comportamento eleitoral. As políticas mais específicas agora aprovadas para o setor da habitação vão, na generalidade, para o lado da procura. Caminha-se para a desregulação do mercado de arrendamento, sendo que do lado da oferta são reforçadas intenções. O problema é que atuar no lado da procura, sem um prévio crescimento da oferta, só alimentará a subida dos preços. Sejamos claros: o estrangulamento está no lado da oferta e a situação é tanto mais grave quanto é um problema generalizado em termos internacionais, resultante de profundas alterações demográficas e comportamentais.

Finalmente decidiu-se onde construir o aeroporto de Lisboa, complementado por uma nova ponte sobre o Tejo e o TGV. E complementado ainda pelo reforço claro do aeroporto existente. Abre-se a porta para a satisfação das pretensões de grupos profissionais. São anunciadas sucessivas reduções fiscais. Sound bytes e emoções – e eleições.
Governa-se por promessas constantes, jogando sempre com emoções. No que respeita à imigração, foi agora prometido rever o modelo institucional de fiscalização, não ficando sequer claros os pressupostos sobre que se baseia. Foi prometido rever e formular uma nova estratégia para o SNS. Foi prometido rever e formular uma nova estratégia para a Misericórdia de Lisboa. Em todos os casos as promessas são isso mesmo, insinuando de forma clara que agora é que vai ser, todos os problemas serão resolvidos. Sublinhando promessas, ficam sempre acolhidas emoções e expetativas dos mais diversos grupos. Pode ser que seja eu a ganhar o euro milhões esta semana…
Esperemos que haja dinheiro para isto tudo, porque no final alguém terá de pagar. Sem dúvida alguma. A minha costela de economista afinal ainda vibra… As instituições económicas, bem como as instituições políticas, são determinadas pelas escolhas coletivas das sociedades que, como acontece sempre em tudo na vida, têm consequências.

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