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Tempos difíceis I

Portugueses bacteriologicamente impuros

Tempos difíceis I

Escreve quem sabe

2022-09-06 às 06h00

Vítor Esperança Vítor Esperança

Ahistória não se repete, mas a evolução social e económica da humanidade tem ciclos cujas semelhanças nos fazem recordar tempos do passado. O final do século XX trouxe-nos enormes avanços tecnológicos e económicos essencialmente devido à revolução digital. A velocidade e facilidade como a comunicação evolui, incluindo a interação com as máquinas, gerou aumentos de produtividade na economia nunca antes visto. O avanço da ciência acompanhou a nova revolução, permitiu que a economia mundial crescesse com a visibilidade de vermos reduzir a pobreza para muitos milhões de seres humanos no planeta, fazendo acreditar que estaríamos no início de um futuro risonho para todos, com a particularidade de vernos estes avanços liderados por sistemas políticos abertos e democráticos. A par da evolução da economia e da ciência surgiam novos conceitos de uso das tecnologias, com a Internet a revolucionar conceitos de prestação de serviços, transação de conhecimento e conetividade entre pessoas de todo o mundo, as designadas “redes sociais”.
Esta evolução e crescimento mundial aconteceu em período de alguma paz mundial: alguma pois as guerras e conflitos políticos nunca deixaram de existir. Teríamos chegado ao “fim da História” como Fukuyama imaginou e escreveu. A queda de um sistema económico/social (Socialismo) deu mais razão ao sistema a que se oponha (Capitalismo), atribuindo-se ao segundo a vantagem da permanente transformação porque operava em sistemas onde prevalecia a liberdade. Liberdade social, política, económica e financeira. O novo capitalismo trouxe o aumento das relações multilaterais entre Estados, proporcionando o aumento da liberdade concedida às transações financeiras, ao movimento de pessoas e bens em quase todo o mundo, total no espaço da União Europeia. Globalização, assim se passou a designar este movimento económico planetário.
Apesar do aumento generalizado da riqueza mundial e da aparente universalidade das transações, vimos acentuar as desigualdades entre pessoas e países, assistindo ao progressivo e acentuado aumento da riqueza dos mais abastados, a estagnação da designada classe média e a regressão dos mais pobres, algo que já tinha acontecido em tempos passados, sensivelmente nos mesmos períodos seculares, ainda que por razões diferentes. O novo capitalismo assenta o seu ritmo de crescimento na competitividade, baseado no aumento permanente da produtividade e da rapidez e, dimensão das transações económicas e financeiras. Este modelo favorece os mais bem preparados e os detentores dos maiores recursos, incluindo o do saber, resultado; o enorme aumento de riqueza global é acompanhado pelo crescimento acelerado e progressivo das desigualdades, com os extremos a afastarem-se consideravelmente, conforme o provam os estudos publicados por Pikety. Neste novo ciclo de crescimento das desigualdades, já não são apenas os mais pobres que se vêm com sérios problemas de sustentabilidade. Hoje, a designada classe média vê-se cercada pelas dificuldades e sem perspetivas de melhoria futura, com a ameaça de vermos a geração seguinte bastante mais pobre que as gerações imediatamente anteriores.
Tudo isto gera descontentamento que se vem manifestando em diversos acontecimentos no mundo, com a descrença nos modelos e regimes políticos considerados democratas e liberais. Podemos não nos aperceber, mas são as desigualdades que alimentam a agressividade entre homens e nações, favorecem a desordem no protesto, e proporcionam a abertura para a aceitação de soluções radicais e populistas na busca de alternativas que alterem o “status-quo”. Já não é apenas a perda de expetativas geradas pela informação global que está em causa, mas, o retrocesso do bem-estar e o medo do futuro. Todos sabemos que é mais duro e inaceitável a perda do que já se teve, do que a consciência da própria desigualdade. Quero com isto dizer que é mais fácil assistirmos a revoltas dos que empobrecem, ou perdem “estatuto”, do que daqueles que continuam quartados no acesso ao desenvolvimento e à riqueza.
A invasão da Ucrânia, contrariamente ao propagado, não acontece apenas por questões de geopolítica de defesa, ou reunificação cultural, (suposta defesa da russofonia). Acontece essencialmente devido à perda de estatuto económico e político da Rússia no seio das Nações mais ricas e desenvolvidas, apesar de manter o seu estatuto de potência militar no pódio mundial. O saudosismo imperial do seu atual “Czar” e o poderio militar dos seus exércitos permitem-lhe tentar conquistar pela força aquilo que a economia global lhe foi retirando no modelo de competitividade capitalista: quer fundar um novo modelo político, longe das Democracias e do livre mercado. Tempos difíceis os de hoje. Não é apenas pela guerra na Europa que me assusta, mas o saber que são as pessoas desiludidas que livremente permitem que o poder seja acessível aos novos profetas radicais, seja na opção afirmativa dessa escolha, seja pelo afastamento do debate político em Democracia, ou pela ausência na participação dos momentos de escolha que esta permite, fragilizando o modelo que beneficiou o mundo nos últimos tempos.?

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