Correio do Minho

Braga, quinta-feira

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Um homem bom

Entre a vergonha e o medo

Um homem bom

Ideias

2019-01-08 às 06h00

João Marques João Marques

É raro na política como é raro na vida conhecer gente que combina três qualidades impactantes: a honestidade, a coragem e o carisma. Sim, este é um texto laudatório e é-o sem vergonha. Conheço Miguel Macedo há mais de 15 anos e desde o início me marcou a simplicidade e simpatia no trato. Foi pouco tempo antes da primeira campanha de Ricardo Rio para a Câmara Municipal e admito o grande impacto que me causou conhecer, ao vivo e a cores, uma “figura da TV”, já na altura ministeriável.
Longe estava eu de pensar que iria ter o privilégio de trabalhar com ele, durante mais de 2 anos, no XIX Governo Constitucional, entre 2012 e 2014, ele enquanto Ministro e eu no papel de um mero adjunto. Pude testemunhar a capacidade de trabalho, a entrega e dedicação à causa pública, o bom humor, mas também a exasperação face à mediocridade, num exemplo claro daquilo a que, na política como na vida, se chama carisma. E já se sabe: um político sem carisma é como uma refeição sem sal, pode ser saudável, mas, em boa verdade, não faz bem a ninguém.

Avesso ao mediatismo inconsequente e à busca de protagonismos estéreis, sempre agiu com uma eficácia serena e com resultados palpáveis. Sem temores, assumiu, a seu cargo um dos ministérios mais exigentes do governo do país. Diz-se, de resto, na gíria política, que o Ministério da Administração Interna só é notícia por más notícias. Se há incêndios florestais, lá está o MAI; Se há motins populares nos estádios ou nas ruas, lá está o MAI; Se há acidentes rodoviários, lá está o MAI; Se há problemas migratórios, lá está o MAI; Se nada se passa e tudo está tranquilo, ninguém sabe nem quer saber quem é o MAI.
Ao longo dos mais de 4 anos em que exerceu funções de ministro, recolheu a admiração de muitos dos setores que tutelava. Nas polícias renovou efetivos e pagou promoções que outros, antes de si, deixaram validadas, mas para as quais se esqueceram de aprovisionar as verbas necessárias. Na proteção civil agilizou inúmeros processos de aquisição de material de combate aos fogos, de requalificação de infraestruturas, ao mesmo tempo que dava um passo importante na dignificação da carreira dos bombeiros portugueses. Não foi por acaso que, no momento da saída, viu inúmeras corporações e associações representativas dos soldados da paz prestarem-lhe pública homenagem. Tudo isto num dos momentos de maior aflição financeira por que Portugal já passou. Num misto de sagacidade política e engenho financeiro, foi capaz de serenar o ministério e garantir a paz pública, tal como o testemunham os índices de criminalidade historicamente baixos registados no período em que liderou a Administração Interna.

Desconheço e espero nunca conhecer a dimensão da mágoa, da revolta e da desilusão geradas pela situação por que passou. Não só por ele, mas sobretudo pelos seus. Pela família, pelos amigos, por todos aqueles que, como eu, o respeitavam, respeitam e respeitarão, independentemente do resultado da decisão judicial. Tenho, porém, a certeza de que a mesma resiliência e combatividade que demonstrou como político, a mesma lucidez, tranquilidade e nobreza com que passou, como cidadão, pelo vexame de um julgamento público, serão empregues no muito que ainda tem por fazer.

Não, Miguel Macedo não me pediu para escrever este texto. Não me tem, nunca me teve, nem desejou ter-me a soldo. Só quem não o conhece é que pode desconhecer que, se alguma coisa me pedisse, seria exatamente o oposto, que não o fizesse, que evitasse, sobretudo nesta altura, vir a terreiro falar no seu nome e defender o seu percurso. Apesar disso e porque compreendo bem as “canalhices” a que o sujeitaram nos últimos anos, não podia deixar de aproveitar este que é um momento de felicidade para todos os que o estimam e consideram, independentemente dos legítimos recursos que ainda venham a ser interpostos pelas partes, para dar-lhe uma palavra pública, incontida e sonora de amizade e admiração.

E não, isto não é um epitáfio, isto é um chamamento. Miguel Macedo, com os muitos anos dedicados à vida pública portuguesa, amealhou um capital de experiência e saber fazer que causa inveja a muitos. Não precisa de reabilitações ou branqueamentos do passado. É um homem bom, honrado, sério e com uma invulgar capacidade política. Nos dias de hoje, em que mais do que nunca se reclama por gente de palavra, com princípios e com sentido de Estado, não tenho dúvidas em escrever que ainda iremos ouvir falar dele muitas vezes. Tanto melhor.

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