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Um Natal diferente

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Um Natal diferente

Ideias

2020-11-30 às 06h00

Felisbela Lopes Felisbela Lopes

Estamos a atravessar um tempo difícil. Os números de novos infetados, de pacientes em unidades de cuidados intensivos e de mortes são pesados. Assustam. Muito. Já percebemos que a economia não aguenta um confinamento severo, mas o Serviço Nacional de Saúde também não resiste a tantos doentes e isso impõe sucessivas medidas de restrições. Tudo isto exige que se pense a quadra natalícia de forma diferente.
Não poderemos ter um Natal como o habitual. Nem tão pouco conseguiremos fazer os tradicionais almoços ou jantares natalícios com os amigos e colegas de trabalho. A regra é simples: precisamos de reduzir drasticamente o número de contactos. Porque disso depende a evolução desta pandemia.

Comparativamente com outros países europeus, os portugueses tiveram um comportamento exemplar na primeira vaga. Do ponto de vista político, as decisões foram céleres e acatadas depressa por todos. Já nesta segunda vaga, houve hesitações quanto às medidas a tomar e sectores da população têm manifestado publicamente algum desagrado face às decisões tomadas. Não somos um caso isolado. Em várias geografias, multiplicam-se protestos que podem ser divididos em dois blocos: sectores profissionais em desespero por uma crise que lhes consome a vida e negacionistas em devaneios perigosos.

Por cá, o Presidente da República já veio lembrar que desenharemos em dezembro aquilo que vai acontecer nos primeiros meses de 2021. Há quem fale já numa terceira vaga. Que temos de evitar. A todo o custo. No entanto, este não é um desafio fácil de cumprir. Porque temos pela frente um mês de festas familiares, de agitação comercial, de temperaturas gélidas a puxar-nos para espaços aquecidos partilhados com outras pessoas... Para mim, este é o tempo mais penoso desta pandemia. Porque temos de desistir daquilo que constitui o eixo central deste tempo: dos encontros. Ainda para mais, temos sobre nós o peso de dez meses de isolamento social. Nunca vivemos tantos dias fechados em casa, afastados uns dos outros, com medo de estar acompanhado.

Neste período, para lá do consumo de uma noticiabilidade que retrata como pode o país e o mundo, tenho procurado livros que me abeirem de âncoras que me orientem por um quotidiano cheio de perplexidades, ansiedades, medos... Das obras de Slavoj Žižek (“A pandemia que abalou o mundo”) e de Ivan Krastev (“O futuro por contar – como a pandemia vai mudar o nosso mundo”) recolhi notas de grande desassossego pela deriva que se vive hoje à escala global. Tenho encontrado algum alento em Bernard-Henri Lévy que, no livro “Este vírus que nos enlouquece”, contesta a ideia de que nada será como dantes. Pelo contrário, este autor está convicto de que haveremos de voltar à confiança, ao aperto de mão, aos abraços e às viagens. À espera, estão já mais dois livros, o de Debora MacKemzie (Covid-19- a pandemia que nunca deveria ter acontecido e como impedir a próxima) e o de António Damásio (Sentir &Saber). Através deles, espero compreender melhor o mundo que fomos e as pessoas que vamos procurando ser.

Na verdade, estes dias são penosos. Na universidade, os alunos ali estão à minha frente, mas é tudo diferente: pela primeira vez em 26 anos de trabalho, ali estou eu em cima de um estrado praticamente imóvel e sem desafiar permanentemente a turma para pensar comigo a matéria que vai sendo apresentada. Os meus amigos também vão ficando a distância de uma videochamada ou de um telefonema. Falamos bastante, mas todos sabemos que nada é igual.
No entanto, há uma certeza que nos deve acalentar: este tempo vai passar. Já passaram muitos meses. Não temos assim tanto tempo pela frente. Agora é preciso apenas mais um esforço. É duro? Muito, mas este Natal poderemos ensaiar outras formas de trazer as pessoas para perto de nós. Não será muito difícil, porque algumas delas nunca saem do nosso coração.

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