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Um país doente

Um batizado especial

Ideias

2016-02-01 às 06h00

Felisbela Lopes Felisbela Lopes

“Nunca houve tantos suicídios”, noticiava em título o Expresso desta semana. No mesmo dia, o Sol assegurava que “médicos e enfermeiros estão em colapso”. O país está doente e isso sente-se nos rostos fechados que connosco cruzam num quotidiano por vezes demasiado hostil para nos devolver a esperança que tanto procuramos.

A fonte é o Sistema de Informação dos Certificados de Óbito e testemunha que em 2014 o número de suicídios cresceu 16 por cento, registando-se um maior aumento entre as mulheres que se suicidam cada vez mais novas e de forma mais violenta. O coordenador do Programa para a Saúde Mental explica-nos que estes dados denunciam um grau de desespero progressivamente mais acentuado. E isso deveria suscitar um urgente e aprofundado debate acerca das políticas públicas que promovemos no campo da saúde mental. Na mesma notícia, cita-se ainda um estudo que revela que um em cada cinco portugueses está em sofrimento, ou seja, está doente. E isso tem repercussões em vários planos: pessoal, familiar, profissional, social... Ninguém promove um ambiente feliz quando está triste e dificilmente alguém consegue ser rentável quando se sente deprimido.

No mesmo texto do Expresso, anunciava-se ainda que todos os dias são vendidas em Portugal 23 mil embalagens de antidepressivos. É essa medicação que nos vai ajudando a enfrentar um contexto de crise, um imparável desemprego, um ambiente agressivo de gente muito angustiada perante a vida de todos os dias.

Num país onde a saúde mental não é uma prioridade, a depressão ainda não se apresenta como uma doença prioritária. E deveria sê-lo, porque afeta um número crescente de cidadãos, inclusive os profissionais da saúde. Na edição de sábado, o Sol publicava uma reportagem que relatava o cansaço extremo em que vivem médicos e enfermeiros. Porque trabalham horas intermináveis, porque estão inseridos em ambientes profissionais sem grandes recursos para fazer um trabalho de qualidade, porque se sentem pressionados de vários lados: por uma carreira cada vez mais competitiva e menos bem remunerada, por administrações que lhes pedem poupança de meios, por doentes e familiares que começam a exigir cuidados de saúde com mais qualidade.

Talvez o ministro da Saúde não disponha de um orçamento que lhe permita grandes investimentos em determinadas áreas, mas é um facto que a saúde mental deveria ser uma prioridade. Adalberto Campos Fernandes começou este mandato, assegurando que a sua ação política se orientaria por uma atenção permanente à prevenção. Se esta intenção política se mantiver, há muito para fazer, nomeadamente ao nível do acesso que os cidadãos (não) têm a certas especialidades médicas e a exames de diagnóstico.

Será hoje fácil marcar uma consulta de psiquiatria num hospital público? Terão os centros de saúde consultas a este nível? As doenças mentais não podem ser apenas tratadas quando há dinheiro para pagar consultas em clínicas ou consultórios privados. Alguém deixará uma gripe por curar no Sistema Nacional de Saúde? A resposta deveria ser negativa, mas teme-se que não há aqui respostas inequívocas quando uma parte substancial dos portugueses está distante dos serviços de saúde.

No sábado, o Jornal de Notícias revelava que 220 mil portugueses estão longe da uma urgência diferenciada. Se pensarmos que estamos a falar aqui de uma população essencialmente rural, com pouca formação e muito envelhecida, essa distância não deve apenas calcular-se em função dos quilómetros que separam esses utentes de um hospital, mas deve sobretudo aqui ponderar-se o grau de inacessibilidade que a saúde tem para estas pessoas.

Num país muito assimétrico na oferta e no acesso a cuidados de saúde, as notícias que falam de doenças deveriam fazer-nos parar para inverter rumos de ação. O mais grave é constatar-se que estas situações não fazem parte do discurso político e estão ainda muito longe das preocupações dos políticos que gerem as nossas vidas. E isso também é muito preocupante.

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