Correio do Minho

Braga, segunda-feira

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'Um sonho de verão', Francisco Correia

Premiando o mérito nas Escolas Carlos Amarante

Conta o Leitor

2011-07-28 às 06h00

Escritor Escritor

Simão estava contente naquele dia. Mas também estava triste.
Contente porque já era verão e estava em férias.
- Que bom! - só tinha de pensar.

Para mais, o ano escolar tinha corrido “altamente”!
Mas estava triste também, pois sua mãe, Laura, continuava com reuniões na sua escola.
- Ó mãe, porque tens tantas reuniões? - perguntou Simão, enrugando algumas sardas do seu nariz.
- Ora, filho, para falarmos sobre este ano letivo, e começarmos a organizar o próximo.
- E tu falas, mãezinha? - quis saber Simão, sorrindo e mostrando uns dentes brancos como pérolas.
- Claro, Simão! É importante participar! - disse Laura, em tom didático.
- E os outros mãezinha, também participam?
- Hum… sim…

Mas Laura, vendo que os olhos muito castanhos, muito brilhantes de Simão se abriam como que em jeito de interrogação, acrescentou:
- Bem, há quem esteja mais concentrado no seu computador, outros a responder a mensagens nos telemóveis, …
- Mas isso é errado! - atirou Simão, em tom zangado!
- Claro que sim, filho, mas deixa isso por agora comigo, e pensa que amanhã estarás na praia com a avó.

Palavras mágicas para Simão: a avó e a praia!
Acordou cedo. Estava um dia cheio de Sol. Sol do próprio astro, quente, luminoso. Igual ao sol-sorriso dos meninos, afortunados, como ele, por terem uma avó.
Estava tudo pronto. E nem as pantufas da avó faltavam!
- À noite, faz sempre fresco no apartamento. - comentava ela, por antecipação.
Mas ele sabia que a avó era inseparável daquelas pantufas. Pareciam almofadas ambulantes. Cada uma delas com dois pom-pons amarelo vivo, a fazer lembrar o filou, um gato que tiveram em tempos.

- Que engraçada a vovó! Andar sempre com pantufas desta cor!
Mas ele próprio já estava habituado àquelas pantufas. Sobretudo quando no silêncio da noite, ouvia o ruído daquelas “almofadas”. Uma música pesada, mas mansa. Pam! Pam! E sabia ser sua avó que lhe vinha dar um beijo de boa noite.
Eis a praia! Que euforia!

- Simão, não te afastes muito. - dizia-lhe a avó, enquanto tentava proteger os seus caracóis miudinhos, de um louro muito seco, por baixo de um bonezinho que lhe cobria a cabeça.
E Simão saiu correndo, não sem antes se despedir de sua avó com um sorriso, enquanto ela compunha o seu chapéu de palha, cor de mel, por cima do seu cabelo branco, igual à brancura da neve com a transparência da água de uma fonte.

“Praia dos Sonhos”, era assim que se chamava aquela praia. Areia dourada e fina, quase não rangia com o pisar dos passos. O vaivém, compassado, das ondas, libertava uma música ritmada que não impedia de ouvir o cantar das gaivotas. O céu sobre o mar parecia uma extensa colcha de seda, onde pontuavam flores brancas e um enorme Sol de oiro. À noite, aquele manto de seda tornava-se azul, muito azul, ilustrado por estrelas cintilantes e uma Lua, às vezes tão redonda e translúcida, que quando decide vir descansar sobre as águas, transforma-as num imenso espelho reflector.

Assim andava Simão, pensando em tudo isto.
A certa altura, sentiu-se cansado e fazendo do areal um travesseiro nele mergulhou com convicção.
Estava nisto há algum tempo, quando de repente lhe pareceu ouvir:
- Simão, Simãao!
- Não, não podia ser! - ajuizou.
Encolheu os ombros e deixou-se continuar com aquele silêncio madrasto que se fizera convidado.
- Simão, Simãao!

Desta vez, aquilo que há pouco lhe tinha soado como uma impressão ou, quando muito, um assobio melodioso do vento, era agora uma voz clara, sonora, e… Sim. Chamava mesmo por si!
Começou por devolver os ombros ao lugar, depois esticou o pescoço, por fim levantou a cabeça, e olha… Era um papagaio! Um papagaio, daqueles animados pelo vento. E tantas cores: verde, amarelo, violeta, … Com tantas cores, iguais ao arco-íris que se debruçava no céu depois da chuva. E tinha olhos azuis, como miosótis. As faces muito vermelhas, duas rosas vermelhas mesmo debaixo dos miosótis. Daí que quando cirandava no ar, era o vermelho que sobressaia. Um novelo vermelho! Ou uma flor de fogo! E falava! Oh sim, mal podia acreditar!

- Olá, Simão! - disse o papagaio.
- Olá! - respondeu ele ainda indeciso.
- Como sabes o meu nome? - indagou.
- Eu sou amigo do vento, e este é a Natureza, assim como a terra… a areia onde estás sentado, o mar… e para a Natureza não há segredos.
- Agora, diz-me, o que faz um menino como tu tão pensativo?

Simão conseguiu cativar um soluço que se esgueirava e respondeu:
- A minha mãe ainda está a trabalhar, a escola já acabou e eu sinto saudades dos meus amigos!
- Simão, bem me parecia! - articulou o papagaio - Olha, não fiques triste, tens tantas coisas à tua volta para te relacionares…
- Tenho? - reagiu Simão, recuperado do espanto inicial.
- Tens sim, Simão - respondeu o papagaio, para logo de seguida as enumerar: - acaricia as ondas que chegam para cumprimentar a areia; desenha caretas na areia molhada e faz uma estória; abre os braços ao vento que te refresca, e abraça-o nas tuas correrias; e abre os teus olhos ao Sol para que o seu brilho se alimente no dele e nunca desfaleça; ama a Natureza e ela será sempre a tua melhor amiga!

Entretanto, ouve-se:
- Óscar, Óoscar…
- Simão, chamam-me - diz o papagaio - tenho que ir, mas não te esqueças do que falámos! - ouviu-se ainda do eco da sua voz…
- ÓSCAR, ÓOSCAR - acordou Simão, de voz rouca, tudo e todos em casa, naquela manhã.
Laura, foi a primeira a chegar ao quarto e, de braços abertos, recolheu-o no seu colo.
- Simão, filho, estou aqui, está tudo bem.

- Foi um sonho, mamã, foi um sonho! …
Retemperado pelo afago vespertino de sua mãe, Simão deixou-se ficar deitado mais alguns minutos, revisitando o seu surpreendente sonho.
Aceitou uma lágrima, quase redonda, que lhe deslizou pela face, saltou da cama e abriu as janelas de par em par. De imediato, foi saudado por uma rabanada de vento. Sorriu, e empoleirada numa cadeirinha de verga reparou que, na linha do horizonte, uma bola de fogo se contorcia no ar, frenética. Assustou-se! Seria o “seu Óscar” aprisionado por um vento egoísta que inflamava um incêndio na mata? Não. Era sim o “seu Óscar”, que se deleitava saudando um novo dia ou, quem sabe, alegrando um outro “Sonho de Verão”!

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