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Uma conversa sobre inflação

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Uma conversa sobre inflação

Escreve quem sabe

2022-12-02 às 06h00

Vítor Esperança Vítor Esperança

Há dias, em conversa de circunstância com um amigo, pergunta-me este:
- Se a inflação faz subir o preço de tudo, então o valor do que hoje temos aumenta também, ou seja, o país fica mais rico?
- Em valor absoluto sim, mas, é uma Ilusão. Partindo do princípio que o dinheiro que existe em circulação não aumenta, então todos teremos que gastar mais para comprar o mesmo. Isto torna-nos mais pobres, e não mais ricos. Esta é uma realidade imediatamente sentida por quem vive de rendimentos fixos, designadamente os assalariados e reformados, a menos que as remunerações também subam e anulem a subida do preço das coisas onde que iremos gastar o nosso dinheiro.
- Mas, se os empregadores não sobem os salários, ficam estes a ganhar com a inflação, pois sobem os preços do que vendem. Certo?!
- Depende: Também aqui pode haver uma ilusão. Os ganhos das empresas são obtidos pela diferença do somatório de todos os seus gastos, com a de todas as vendas. Ora, mesmo que os gastos com pessoal possam não subir tanto como o valor da inflação, os gastos com outras compras podem subir muito acima disso. Claro que podem subir o preço do que vendem quando quiserem, mas também sabem que quem compra pode deixar de o fazer porque encontra o mesmo noutro, a preços mais baixo, ou simplesmente prescindem da compra. Há naturalmente quem se aproveite, aumentando os preços mais do que os verificados no tal somatório dos seus gastos, sobretudo aqueles que vivem em situações em que a concorrência (mercados) não funciona, os tais monopolistas, que sabem que só eles fornecem aquilo, com a agravante de a maioria do que vendem ser indispensável para as pessoas, como acontece com a água, energia (eletricidade e combustíveis) ou determinados alimentos. Esta é a razão por que se pede ao Estado que fiscalize e regulamente, para que não haja abusos. Há ainda que ter em atenção que a maioria dos empregadores são empresários pequenos, que vendem produtos ou serviços de baixo valor, facilmente substituídos, ou simplesmente prescindíveis, ou seja, podem ficar com as vendas abaixo dos gastos fixos, entrando em prejuízo.
- Então é por isso que se fala em recessão?
- É um dos motivos, sim. Se houver muitas empresas e durante bastante tempo a reduzir a sua produção porque vendem menos, pode leva-los a ter que reduzir o trabalho que fazem com o consequente aumento do desemprego. As mais pequenas acabam por fechar e as grandes despedir em massa. Na verdade, a inflação alta trás problemas à economia, tornando-nos mais pobres apesar do aparente aumento do valor das coisas.
- Mas, os Governos não podem impedir que os preços subam?
- Dificilmente. Isso só seria possível num mundo onde não existisse liberdade de escolha e os preços de tudo fosse tabelado. Um mundo que não existe, um mundo que só nos aproximamos dele quando há grandes desgraças, como guerras e ditaduras. A inflação não é uma operação que possa ser programada ou manipulada mas, uma tendência replicada por milhões de intervenientes económicos.
- Mas sempre ouvi dizer que a inflação em determinados países é alta e isso não trouxe recessão.
- É verdade. Hoje a inflação atinge quase todo o mundo, pois vivemos numa económica global, onde o que consumimos hoje pode ter sido produzido nos dias imediatamente anteriores, no outro lado do mundo. Claro que isto surge rapidamente e em todo o lado porque há produtos que servem de base a toda a economia, como o petróleo ou o gás, recursos escassos e que poucos produzem. Basta um deles, como é o caso da Rússia, deixar de o fazer, o mercado entra em alerta e isso gera aumento dos preços nos mercados.
- Mercados. Essa coisa dos mercados deixa-me confuso. São os capitalistas?
Capitalistas é um termo usado politicamente para muita coisa, mas o mercado, ou mercados, somos todos. É o mundo das transações, dos que produzem e dos que consomem. A confusão com o capitalismo tem a ver com a equiparação/substituição que o dinheiro tem em tudo o que se produz e se faz. O dinheiro representa a riqueza, e paga tudo. Quem tem muito, tem também melhor informação, a atua rapidamente. Os mercados reajam a estes comportamentos, dando a sensação que são eles (os tais capitalistas) que mandam.
- Mas porque é que inflação agora é mais perigosa?
- Porque atinge quase todo o mundo. A subida generalizada dos preços não começou agora. Isto aconteceu no período de pandemia do Covid. A reação do mundo ao vírus foi o de se fechar em casa, parando a economia em todo o lado. A feliz e rápida descoberta das vacinas, proporcionou à economia ambicionar rapidamente voltar às suas rotinas, mas a amplitude do fecho global gerou atrasos e quebras de produção que não são facilmente repostas, fazendo os preços do que se pretende urgente subir muito. A competitividade dos mercados proporcionou essa guerra de preços, criando uma inflação global. Mas o pior veio depois, devido à guerra iniciada por um dos maiores produtores de gás e petróleo do mundo. A reação de uma boa parte do mundo, foi o da condenação dessa atitude, o que originou uma resposta de redução/ quebra dos fornecimentos, verificando-se simultaneamente, a redução/quebra das aquisições a esse produtor. A energia que sustenta a forma de vida na Europa incluindo a sua estrutura produtiva é fortemente afetada e os preços voltam a subir numa escala maior. Já não estamos apenas perante uma situação de comportamentos típicos dos mercados, mas dependentes das atitudes de política internacional. A inflação em tempos de guerra pode tornar-se desastrosa para as economias mais débeis e endividadas e seus respetivos cidadãos.
- Então isto vai piorar?
- (no próximo texto, continuamos a conversar).

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