49.3
Ideias
2023-01-14 às 06h00
Lá diz o velho dilema “quem apareceu primeiro, o ovo ou a galinha?”. A resposta é inconclusiva. Neste texto, passa-se algo parecido, o da relação entre valorização do trabalho (salarial) e crescimento económico. Então, temos “primeiro crescer a economia para depois valorizar o trabalho ou valorizar o trabalho (salários) para depois crescer a economia”. A propósito, tem vindo a surgir várias teses pretendendo responder a esta questão. Neste texto, ir-se-á abordar as duas principais correntes de pensamento económico versando sobre a relação entre valorização do trabalho (salarial) e crescimento económico, a saber:
(I a) Neoliberalismo;
(I b) Intervencionismo. Ambas defendem a economia de mercado, porém, diferem, e muito, sobre o modo como ela deve funcionar e qual o papel do Estado na melhoria do desempenho económico. Por sua vez, na segunda parte (II), aponta-se o valor do salário médio em Portugal no contexto da União Europeia (UE-27). Nota-se que aos países com melhores salários médios corresponde taxas de crescimento económica mais elevadas.
(I a) Neoliberalismo: desde o término da IIª Grande Guerra que tem vindo a adotar os princípios básicos da escola clássica ou liberal (finais do século XIX), fruto da “Revolução Industrial” e da emergência do capitalismo como modo de produção. O neoliberalismo defende que o funcionamento da economia deve assentar na livre iniciativa, no livre jogo da oferta e procura (sistema de preços) e no objetivo central de maximização do lucro pelas empresas, ou seja, defendem o mercado livre e o Estado mínimo. Para os neoliberais se assim for atingir-se-ia um desempenho económico otimizado (com pleno emprego), um equilíbrio geral e dos mercados particulares e uma eficiente alocação dos recursos. Argumentam que desta forma estariam criadas as condições para a existência de um crescimento económico estável e de longo prazo!
(I b) Intervencionismo: critica os pressupostos do modelo económico neoliberal, o que seria demonstrado pela evidência empírica. Por um lado, pretende mostrar que a economia de mercado livre é inerentemente instável funcionando em ciclos económicos com fases expansionistas seguidas de fases recessivas (mais ou menos profundas) e vice-versa. Logo, não estariam garantidas as conclusões dos neoliberais de existência de equilíbrios económicos, de alocação ótima dos recursos, de situação de pleno emprego e de crescimento económico estável e de longo prazo. Pelo contrário, os intervencionistas apontam para o papel central do Estado no funcionamento da economia de mercado quer em termos económicos, em particular, quanto as suas fases recessivas quer em termos de equidade social. Assim, para sair das fases recessivas relevam a necessidade de intervencionismo através do aumento da despesa pública, por ser geradora de efeitos multiplicadores na economia. Mais despesa pública significa mais rendimento, mais consumo das famílias, mais investimento interno (público e privado), mais procura agregada, e logo, mais produção (oferta agregada), mais rendimento e mais emprego.
Em termos de equidade social, os neoliberais não assumem como prioritária a questão da repartição justa do rendimento entre trabalho e capital. Sendo assim, alegam que primeiro há que fazer crescer o bolo (produção) para depois o repartir (rendimento) de forma mais equilibrada! Ora, para os intervencionistas não é isso o que acontece na prática: “nada garante que um bolo maior (com o crescimento económico) beneficie as classes mais desfavorecidas. Para o intervencionismo sem a ação estatal, o que sucede é que a proporção do “bolo maior”, na prática, permanece igual (ou pode mesmo aumentar) para os poucos muito ricos em detrimento dos muitos muito pobres!
(II) Segundo a Eurostat em 2021, o nível do salário médio em Portugal para um trabalhador a tempo inteiro foi, em média, de 19 300 euros ilíquidos (ainda sem descontos) por ano, traduzindo, com isso, um valor de apenas 58% da média da UE-27 e de 68% do que é auferido em Espanha! Então, em Portugal, o salário médio anual ilíquido foi o 10.º mais baixo da UE-27, sendo o salário médio da UE-27 de 33 500 euros por ano. Os salários médios anuais ilíquidos mais altos foram registados no Luxemburgo (72 000 euros), na Dinamarca (63 000 euros) e na Irlanda (50 000 euros). Itália, Espanha, Malta e Chipre também possuem uma média mais elevada que Portugal. O salário médio mais baixo foi na Bulgária (10 400 euros), Hungria (12 600 euros) e Roménia (13 000 euros). Letónia, Chéquia, Croácia, Eslováquia, Grécia e Polónia também apresentam valores inferiores ao de Portugal.
Concluindo, sendo a economia portuguesa uma pequena economia com um setor privado frágil, o intervencionismo do Estado pelas vias do investimento público, de mais qualificação profissional de trabalhadores e empresários e de uma forte aposta na inteligência artificial (IA), surge como estratégico visando um crescimento económico sustentado. Por sua vez, a economia portuguesa continua a assentar em baixos salários, como se pode observar no “ranking” dos salários médios anuais ilíquidos da UE-27, o que é inaceitável por gerar trabalhadores pouco motivados com pouco poder de compra. Se a economia de mercado livre endogenamente não garante a equidade social, então, torna-se indispensável a atuação estatal, nomeadamente usando os instrumentos tributários e dos apoios sociais para se alcançar uma sociedade menos desigual.
20 Março 2023
18 Março 2023
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