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Vida e Obra de Paulo Freire – Parte II

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Vida e Obra de Paulo Freire – Parte II

Voz às Escolas

2024-03-27 às 06h00

Maria das Dores Ramos de Passos Silva Maria das Dores Ramos de Passos Silva

Podemos considerar que a obra de Freire se organiza em torno de cinco grandes influências: o humanismo cristão, o marxismo, o existencialismo, a fenomenologia e o construtivismo. Relativamente à influência do humanismo cristão, verificamos que toda a sua obra está ligada a uma ótica teológica e que a sua formação católica o vai acompanhar ao longo da sua vida. Na sua obra são constantes as alusões à sua fé, à humildade, à esperança e ao amor entre os homens, mas também, e no geral, todos os seus escritos nos demonstram a sua conceção de igualdade entre os homens, que se funda na liberdade e no respeito pelos outros. Daqui resulta a sua influência no desenvolvimento da ‘Teologia da Libertação’, perspetivada a partir do Terceiro Mundo, e que pretende dar voz aos oprimidos deste mundo, na procura da humanização. Freire considera que a Igreja deve estar comprometida neste processo de libertação do homem (Igreja profética). Para além disso, na «Pedagogia do Oprimido» diz que “ao fundar-se no amor, na humildade, na fé nos homens, o diálogo se faz uma relação horizontal, em que a confiança (itálico do autor) de um polo no outro é consequência óbvia” (2003: p. 81). Este afirmar do diálogo baseado numa relação entre iguais (à luz de Deus somos todos irmãos) é contrária à conceção ‘bancária’ da educação que se fundamenta numa relação vertical em que um diz e o outro escuta, em que um sabe e o outro tudo ignora ou em que um é o sujeito do processo e os outros são só objetos. Pelo contrário, a educação ‘problematizadora’ fundamenta-se na relação dialética e dialógica entre o educando e o educador o que tem como consequência a aprendizagem em comum.
Os fundamentos marxistas podem ser perspetivados pela comparação com a obra de António Gramsci. Viegas Fernandes refere que a influência deste autor se encontra em três situações: na consideração de que todos temos potencialidades intelectuais e que elas não variam pela origem social; na importância da dialética entre a teoria e a prática; e no trabalho em conjunto entre os intelectuais e os mais “simples”, nos movimentos sociais, de forma a ajudá-los a progredir.
O existencialismo considera o homem como um ser no mundo, não o isolando nem dos outros homens nem do mundo em que vive. Por outro lado, encara-o com um ser inacabado. Freire na mesma linha dos existencialistas diz: “a reflexão […] não é sobre este mundo sem homens, mas sobre os homens em suas relações com o mundo. Relações que se dão simultaneamente. Não há consciência antes e um mundo depois e vice-versa” (ibidem: p. 70). Também sobre a questão do homem como ser inconcluso, Freire esclarece que “diferentemente dos outros animais, que são apenas inacabados, mas não são históricos, os homens se sabem inacabados. Têm consciência de sua inconclusão” (ibidem: p. 73). Para Paulo Freire há três níveis de consciência: a ‘consciência intransitiva’, a ‘consciência transitiva-ingénua’ e a ‘consciência transitivo-crítica’. Na primeira há uma imersão na realidade não possibilitando ao ser humano um suficiente distanciamento para poder objetivá-la e ultrapassá-la. No segundo caso, já se verifica alguma emersão, mas as explicações são simplistas e muitas vezes atribuídas ao ‘mundo mágico’.
Num nível mais elevado temos a ‘consciência transitivo-crítica’ correspondente ao momento em que a pessoa consegue emergir da realidade, o que lhe permite uma visão crítica, conscientização, que lhe possibilitará a transformação. Este processo só é possível para Freire através da praxis e do diálogo, em que o educando é o sujeito e o construtor do seu próprio conhecimento. É estudando o “método” de alfabetização de Paulo Freire que podemos verificar a influência dos psicólogos construtivistas. Veremos na próxima crónica como se processava esta forma de alfabetização.

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