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Entrevistas

2025-05-09 às 06h00

Paulo Monteiro Paulo Monteiro

A Comissária Europeia Maria Luís Albuquerque está em Braga. Uma excelente oportunidade, neste dia da Europa para uma entrevista na terra que a viu nascer...

Citação

CM - O dia 9 de Maio é mais um Dia da Europa. Qual é a importância de celebrar este dia num ano que também assinala o 75.º aniversário da Declaração Schuman e o 40.º aniversário da assinatura do Tratado de Adesão de Portugal às então Comunidades Europeias?
MLA - O Dia da Europa é uma oportunidade para refletir e celebrar o caminho percorrido pelo projecto europeu. Quando a Declaração Schuman foi assinada há 75 anos, a ideia de unificar a produção de carvão e aço entre os países europeus era revolucionária, mas serviu para estabilizar a paz na Europa e impulsionar o crescimento económico. Hoje, aquilo que começou como uma iniciativa de seis países no início dos anos 50 cresceu para uma União de 27 países, representando cerca de 450 milhões de pessoas.
É também um orgulho poder assinalar quatro décadas desde a assinatura do Tratado de Adesão de Portugal à União Europeia. A nossa adesão consolidou a nossa jovem democracia e trouxe progressos sociais e económicos significativos – impulsionando o crescimento económico, modernizando infraestruturas, melhorando a educação e os cuidados de saúde, e abrindo novas oportunidades para os cidadãos e empresas portugueses.

CM - Quão importante é organizar este tipo de evento fora do habitual circuito ‘Lisboa-Porto’? A escolha de Braga, por ser a sua cidade, influenciou a decisão?
É sempre um prazer regressar a Braga, onde nasci. Mas esta escolha vai além da ligação pessoal: é essencial que a União Europeia esteja presente em todo o território, e não apenas nos grandes centros. O projecto europeu constrói-se com todos, e por isso é tão importante estar próximo das comunidades locais, ouvir os seus problemas e desafios, conhecer as suas ideias e partilhar aquilo que está a ser feito na Europa. Só com esta proximidade conseguimos uma Europa verdadeiramente coesa e participada.

CM - No programa terá um contacto muito direto com os jovens, incluindo uma visita a uma escola secundária e estará presente num evento com jovens empreendedores. Quão importantes e significativos são estes encontros para si?
Nenhuma viagem para mim está completa sem a oportunidade de falar com estudantes e tenho tido a oportunidade de o fazer nas visitas que realizo aos Estados Membros. São encontros que me inspiram verdadeiramente, porque os jovens têm uma forma muito directa e criativa de olhar para o mundo. São eles que vão construir o futuro da Europa, e por isso é fundamental ouvi-los. Também tive a oportunidade de reunir com um grupo de jovens europeus em Bruxelas para debater o futuro das finanças, e a qualidade e novidade das suas ideias surpreendeu-me pela positiva. Parte dessas propostas está já a ser trabalhada pela minha equipa. Estou, por isso, muito entusiasmada com os encontros em Braga e curiosa para saber o que pensam os estudantes e os jovens empreendedores que se juntaram aqui na região – há sempre muito para aprender.

“A Europa enfrenta uma ameaça extraordinária à sua segurança”
A UE está atenta à segurança. Por isso, segundo a Comissária “apesar de já terem sido canalizados montantes significativos para a defesa são necessários mais esforços”

CM - Falemos agora das prioridades políticas da pasta da Comissária Maria Luís Albuquerque (Serviços Financeiros e União de Poupança e Investimento)... quais são?
Uma das principais prioridades deste mandato é o desenvolvimento de uma União de Poupança e Investimento (Savings and Investments Union - SIU). O objectivo é reforçar e impulsionar a capacidade do nosso sistema financeiro ligando a enorme poupança das famílias da UE a investimentos produtivos, com maior retorno para quem investe, e que apoiem uma Europa mais segura, competitiva, verde, digital e justa.
A SIU é um passo necessário para assegurarmos o nosso futuro. Permitirá aos cidadãos acumular riqueza através de investimentos nos mercados de capitais e permitirá às empresas crescer, inovar e criar empregos, ao satisfazerem as suas necessidades de financiamento na Europa. Continuaremos também a trabalhar para garantir um sistema financeiro sólido e funcional, assegurando que a nossa regulamentação é menos complexa e continua a proteger os consumidores, promove a estabilidade financeira e garante a confiança no setor financeiro.

CM - A sua proposta para a União de Poupança e Investimento visa eliminar barreiras ao investimento transfronteiriço. Quais são alguns exemplos dessas barreiras e como tenciona removê-las?
Só nos serviços financeiros, o Fundo Monetário Internacional estima que as barreiras internas ao mercado único equivalem a uma tarifa superior a 100%, o que implica um enorme custo económico para todos, consumidores e empresas.
Com a implementação da SIU, estamos focados na remoção de barreiras que historicamente dificultaram o investimento transfronteiriço dentro da UE. Exemplos incluem práticas de supervisão divergentes entre Estados-Membros, implementação divergente da legislação europeia a nível nacional, ou práticas discriminatórias aplicáveis a europeus não residentes.
Como parte deste esforço, criámos um canal dedicado para que os participantes no mercado possam reportar obstáculos no mercado único e estamos a recolher informação através de um questionário. Estamos também a trabalhar em medidas para remover entraves às operações transfronteiriças das infraestruturas de mercado e gestores de ativos, e para garantir uma distribuição eficiente de fundos além-fronteiras.

CM - Acredita que os cidadãos da UE estão conscientes das oportunidades que esta nova iniciativa pode trazer para as suas poupanças? Como pretende comunicar isso à população?
Nenhuma iniciativa europeia terá verdadeiro sucesso sem a participação ativa dos cidadãos — e isso é especialmente verdade quando falamos de poupança e investimento. O projeto da SIU não é apenas uma reforma técnica: é uma oportunidade para transformar a forma como os europeus gerem financeiramente o seu futuro. Queremos dar às pessoas ferramentas para fazer crescer o seu património, seja a pensar na reforma, na educação dos filhos ou na realização de projetos de vida. Mas para isso, é fundamental que os cidadãos compreendam o que está em causa e como podem beneficiar. A literacia financeira tem, por isso, um papel central nesta transformação. Não podemos permitir que o acesso à informação e às oportunidades de investimento continue a ser privilégio de apenas alguns. Por isso, estamos a preparar uma estratégia europeia de literacia financeira, pensada para capacitar os cidadãos de todas as idades, promover a confiança no sistema financeiro e incentivar uma cultura de investimento responsável e informada.
A literacia financeira é uma condição de cidadania económica plena — e é nossa responsabilidade garantir que todos os europeus tenham acesso aos instrumentos de que precisam para tomar decisões conscientes sobre o seu futuro.

CM - Pode explicar de que forma a indústria de defesa poderá beneficiar com esta proposta da SIU? Quais são as implicações de longo prazo para o sector?
A Europa enfrenta uma ameaça extraordinária à sua segurança. Por isso, precisamos de mobilizar enormes recursos e capacidade produtiva para reforçar a nossa defesa – o que inclui garantir que o setor da defesa tem acesso ao financiamento privado. Apesar de já terem sido canalizados montantes significativos para a defesa, são necessários mais esforços. A SIU facilitará a mobilização de investimentos privados em setores críticos da economia, como a defesa e o espaço, para quem desejar investir nessas áreas.

“A SIU é agnóstica quanto à direcção do investimento“
É preciso investir mais na inovação, transição digital e ambiental, na defesa e no espaço. E o investimento privado tem de aumentar...

CM - Na sua opinião, quais são os principais desafios que a União Europeia enfrenta atualmente em termos de competitividade face a parceiros internacionais?
A Europa enfrenta hoje um conjunto de desafios estruturais que exigem uma resposta coordenada e ambiciosa. O investimento privado continua abaixo do necessário, sobretudo em setores estratégicos como a inovação, a transição digital e a transição ambiental, a defesa ou o espaço. Ao mesmo tempo, lidamos com custos energéticos mais elevados do que muitos dos nossos concorrentes globais, o que afeta a competitividade das nossas empresas, e uma população envelhecida. Acresce ainda um problema relevante: a fragmentação dos nossos mercados de capitais, que dificulta a mobilização eficiente do financiamento de que precisamos para crescer de forma sustentável. É precisamente aqui que entra a SIU, uma iniciativa pensada para dinamizar a competitividade europeia, aumentando o investimento interno e criando um verdadeiro mercado financeiro à escala europeia, mais integrado e acessível.

CM - Como garante que esta iniciativa será mais consistente do que a União dos Mercados de Capitais, que ficou por concluir? Que medidas concretas serão tomadas?
Esta iniciativa baseia-se nos avanços já alcançados com a União dos Mercados de Capitais. Mas há diferenças importantes. A SIU abrange todo o sistema financeiro, combinando mercados de capitais e setor bancário.
Além disso, foi desenhada para ser mais inclusiva e centrada nos cidadãos, colocando uma ênfase renovada no apoio à sua riqueza e bem-estar. Será também um esforço conjunto entre a UE e os Estados-Membros, que devem assumir responsabilidade para desenvolver os seus próprios mercados de capitais.

CM - O que significa que a urgência da acção foi finalmente reconhecida? Que fatores levaram a esta mudança de mentalidade entre os decisores políticos?
A economia europeia está a ficar para trás face a outros blocos mundiais e corremos o risco de continuar a perder terreno se não agirmos de forma ambiciosa. Há um entendimento claro de que, no mundo atual, a fragmentação não é uma opção. Nenhum país da UE, por mais forte que seja, pode enfrentar sozinho as exigências da economia global. Só com uma resposta coletiva e bem coordenada, que reúna forças de todos os Estados-Membros e aproveite ao máximo os recursos disponíveis, poderemos responder aos grandes desafios que temos pela frente. Há agora um claro impulso político por detrás da SIU porque os líderes políticos da UE compreenderam que a única forma de respondermos aos desafios e às enormes necessidades de financiamento da Europa é agir em conjunto e com determinação.

Como tenciona garantir que os fundos privados são usados de forma eficaz em áreas prioritárias como inovação, descarbonização e tecnologias digitais?
A União de Poupança e Investimento (SIU) é agnóstica quanto a direção do investimento, foi concebida para canalizar fundos para investimentos produtivos em qualquer setor da economia. No entanto, reconhecemos que as áreas de inovação, descarbonização e tecnologias digitais, tal como a defesa e segurança são fundamentais para o futuro da Europa e exigem um esforço significativo de mobilização de capital privado. A transição para uma economia verde e digital não será possível sem a participação ativa do sector privado e as orientações da Comissão são claras quanto aos objectivos estratégicos. Essa segurança na direção das políticas assegura aos investidores a continuidade e estabilidade que precisam para realizar os investimentos avultados de que necessitamos. Por outro lado, o orçamento da União tem instrumentos (e terá mais no futuro) que permitem reduzir o risco do sector privado em investimentos estratégicos, permitindo alavancar esses investimentos privados.

CM - Considerando o atual contexto geopolítico, como é que a UE planeia atrair mais investimento estrangeiro mantendo as poupanças dentro da Europa?
A UE está focada em aumentar a sua atratividade como destino de investimento internacional e em garantir que as famílias europeias tenham acesso a uma vasta gama de oportunidades de investimento dentro da União.
Para isso, estamos a desenvolver medidas para integrar e desenvolver os mercados de capitais da UE, incentivando maior participação dos investidores de retalho, aumentando as oportunidades de financiamento para empresas da UE, removendo barreiras no mercado único de serviços financeiros e simplificando a regulação.
Ao construir um sistema financeiro maior e mais integrado, é possível oferecer rentabilidades competitivas aos investidores e tornar a Europa mais atrativa para o investimento estrangeiro, enquanto garantimos que as nossas poupanças contribuem para a nossa prosperidade e resiliência económica.

CM - Os dados mostram que a UE perde 470 mil milhões de euros em investimentos todos os anos. Que iniciativas estão a ser consideradas para inverter esta tendência?
A União de Poupança e Investimento (SIU) é uma das iniciativas-chave para reverter esta tendência e fortalecer a economia europeia. O objectivo é transformar a maneira como mobilizamos as poupanças privadas das famílias europeias, canalizando-as para investimentos produtivos que beneficiem a sociedade e a economia em geral.
Sabemos que a Europa tem um grande potencial não aproveitado, especialmente no que diz respeito ao investimento nos mercados de capitais.
Segundo o Banco Central Europeu, se as famílias da UE investissem nos mercados de capitais tanto quanto as dos EUA (em vez de manterem os activos em depósitos bancários de baixo rendimento), isso libertaria cerca de 350 mil milhões de euros por ano. Este é um exemplo claro de como políticas certas e um ambiente financeiro mais integrado podem corrigir as distorções atuais e criar um sistema mais eficiente Todos reconhecem a urgência para transformar a nossa estratégia em ações concretas.

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