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Tiago Corais: “O Reino Unido geriu muito mal a fase inicial da pandemia”
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Tiago Corais: “O Reino Unido geriu muito mal a fase inicial da pandemia”

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Tiago Corais: “O Reino Unido geriu muito mal  a fase inicial da pandemia”

Entrevistas

2020-05-11 às 06h00

Paula Maia Paula Maia

Tiago Corais, bracarense a viver no?Reino Unido há vários anos, conta-nos como está a lidar com o surto pandémico que atinge fortemente os britânicos e a estratégia do governo de Boris Johnson.

Citação

É o relato na primeira pessoa de um bracarense emigrado no Reino Unido há vários anos. Tiago Corais conta-nos como está a gerir a sua própria situação pessoa face a uma pandemia à escala global, lançando também um olhar crítico para as estratégias utilizadas por Portugal e o Reino Unido e como é estar longe da sua família numa situação de crise de saúde pública.
Eleito vereador na cidade de Oxford pelo partido Trabalhista, o Engenheiro Industrial no Centro de Desenvolvimento e Engenharia da Jaguar Land Rover revela que está confinado em casa desde 25 de Março, depois da empresa em que trabalha fechar portas.
O bracarense beneficia do apoio de 80% atribuído pelo governo britânico às empresas para apoiar os trabalhadores que estão confinados em casa e que não podem exercer o teletrabalho. “No primeiro mês a empresa deu mais do que isso, 90%. No próximo ficará restrito ao apoio do governo”, conta.

Com a esposa em regime de teletrabalho, Tiago Corais revela que os seus dias têm sido passados a cuidar da filha de três anos, sua principal fonte de preocupação.
“Quando esta situação despoletou a minha maior preocupação foi a responsabilidade de ter uma filha com três anos. Como estou apenas eu e a minha esposa, o medo era se algum de nós ficasse infectado e não termos nenhum familiar para nos apoiar, a não ser amigos. Por isso, o grande objectivo era tentar proteger-nos ao máximo”, explica o bracarense, dando conta que logo que o?Reino Unido decidiu avançar com a estratégia da imunidade de grupo - onde o objectivo era deixar o vírus atravessar a comunidade mas de uma forma mais retardada permitindo que os que sofressem os sintomas mais graves fossem capazes de receber o apoio médico e, assim, impedir que os serviços de saúde não entrassem em colapso - registaram-se casos suspeitos de infecção na empresa onde trabalha. “Nunca nos disseram muito em pormenor o que se passou”, relata Tiago Corais.

Notícias não oficiais davam conta que seriam 30 os casos suspeitos num universo de 250 colaboradores. “Fiquei um pouco em pânico porque não sabia muito bem o que tinham feito para debelar a situação”, continua o vereador de Oxford.
Ao contrário das indicações da Organização Mundial de Saúde, que aconselha em caso suspeito uma quarentena de 14 dias, no Reino Unido, numa fase inicial, às pessoas que tivessem febre e tosse era recomendado que permanecessem em casa pelo menos sete dias.
Tiago Corais relata que houve também uma grande dificuldade na gestão dos testes à Covid-19. “Há três semanas o Reino Unido estava a fazer o mesmo número de testes que em Portugal, sendo que o Reino Unido conta com 50 milhões de pessoas”, diz.

“Quando a estratégia entrou na sua segunda fase, os testes só eram feitos aos casos críticos, ou seja, às pessoas que tivessem febre e problemas respiratórios”, continua o bracarense, não entendendo como é que num país “com tanta ciência, com tantos laboratórios”, o número de testes efectuados eram tão baixos.
“Na minha opinião acho que o Reino Unido geriu muito mal a fase inicial da pandemia. Agora há uma melhoria no número de testes efectuados”, confessa Tiago Corais que fala ainda da escassez de equipamentos de protecção individual, sobretudo nos hospitais. “Assisti a um programa televisivo em que era dito que os stocks estavam todos em baixo. Dessa forma a estratégia que estava pensada inicialmente de imunidade de grupo nunca iria funcionar porque pressupõe uma preparação”, assume o vereador, confirmando que o seu fracasso se reflecte no número de mortos que é já superior ao de Itália. Com um número elevado de mortes, Tiago Corais diz também não entender porque é que o sistema nacional de saúde nunca estou em ruptura, tal como aconteceu em Itália ou até em Espanha. “É importante saber como é que chegou a este ponto e nunca estivemos acima dos 40% nos Cuidados Intensivos. Espero que seja escrutinado essa questão”, revela.

“Foi ‘karma’ ter dois estrangeiros a ajudar a salvar-lhe a vida”
Se a estratégia do governo britânico já vinha dando sinais de mudança, a situação particularmente difícil vivida pelo primeiro-ministro, Boris Johnson, que esteve internado nos Cuidados Intensivos a lutar pela vida, marcou uma viragem de 180º no rumo do país face à forma de combate ao Covid. É neste contexto que sobressai o nome de um enfermeiro português, cujo trabalho em muito contribuiu para que o estado de saúde do primeiro-ministro fosse revertido. “Como português senti um orgulho muito grande quando Boris Johnson agradeceu publicamente ao enfermeiro luso. Por outro lado, e conectando um pouco com o Brexit, pensei desde logo que foi ‘karma’ ter dois estrangeiros a tratar do primeiro-ministro. Espero que tenha aberto um pouco a mente nas duas perspectivas: por um lado o facto dos conservadores sempre terem desinvestido no Serviço?Nacional de Saúde, e por outro, se reflicta que a força do país está não só nos britânicos, mas também nas pessoas que emigram e que vêm para cá”.

“Hoje falo mais com a minha família do que antes”

Tiago Corais tem acompanhando de perto o desenrolar dos acontecimentos em Portugal e de forma particular a situação vivida em Braga já que é aqui que tem a sua família, nomeadamente os pais e o seu irmão gémeo, Miguel Corais, ex-candidato e vereador do Partido Socialista na câmara de Braga.
“Hoje falo mais com a minha família do que falava antes. Sinto que tenho de ser mais solidário, estar mais próximo”, diz o bracarense, mostrando a sua preocupação, sobretudo com os pais que já integram o grupo de risco.
“Tentar proteger os nossos à distância é mais difícil. Uma das coisas que mais me custou foi quando soube que não havia voos. Aí senti a distância de Portugal. Foi nessa altura que comecei também a pensar na minha filha, porque se algo nos acontecesse não tinha o apoio da família”, diz.

O bracarense considera que Portugal actuou “relativamente bem” à pandemia e isso está reflectido nos números que são inferiores, por exemplo, à vizinha Espanha que podia muito bem contagiar o país.
O sucesso é fruto, segundo Corais, não só das medidas políticas, mas também do comportamento da generalidade da população. “Mesmo antes de se fecharam as escolas já muitos pais optavam por não levar os seus filhos. Foi a fórmula possível para obter resultados relativamente bons”, confessa, mostrando-se, no entanto, apreensivo face ao risco de uma segunda onda pandémica. “Tenho dúvidas se ainda é cedo ou não para reabrir, apesar de consideramos que economicamente já é tarde”, assume Tiago Corais, considerando que a retoma será lenta e dependerá do grau de confiança das pessoas.

Numa situação que lhe permite comparar a resposta à pandemia de dois países bem distintos, Tiago elogia a capacidade de resposta demonstrada pela ciência portuguesa, traduzida no papel das empresas, das universidades, dos centros de desenvol- vimento que responderam com prontidão e qualidade nível, por exemplo, dos testes à Covid, no desenvolvimento de ventiladores, das máscaras (ex. Citeve). “Acho que isso demonstrou que Portugal pode, a partir daqui, conseguir uma dinâmica que pode ser direccionada para outras áreas. Podem emergir empresas mais modernas, mais viradas para o futuro. Foi um ponto muito positivo”, admite.
Perspectivando ao futuro, no que ao Reino Unido diz respeito, há uma questão que é impossível não ser destacada: o Brexit.

Desde que despoletou a pandemia assunto ‘Brexit’ saiu praticamente da agenda noticiosa. O divórcio entre o?Reino Unido e os restantes países europeus foi um tema de liderou a actualidade não muito longínqua mas o processo foi ‘travado’ pela situação pandémica a nível global. A questão que se levanta é: estará o Brexit também de quarentena? Terá condições de prosseguir? “Tenho algumas dificuldades em perceber se haverá ou não. Acho que não, mas...” diz a propósito Tiago Corais.
O bracarense diz que o processo ficará dependente do tempo que esta pandemia durar e, mais importante, das suas consequências a nível económico-social que ela acarretar. “Ainda falta preceber quem vai ficar em melhor posição”, diz a propósito Tiago Corais, elogiando, no entanto, a posição e a rapidez do governo britânico relativamente às medidas tomadas para mitigar as consequências económico-sociais.

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